Icterícia no recém-nascido

Dra. Mariana Nogueira de Paula

A icterícia do recém-nascido é uma situação muito comum no período neonatal, ocorrendo em cerca de 70% dos bebês ao nascimento.

O que é icterícia?

Icterícia é um termo utilizado para caracterizar o sinal clínico de pele e conjuntivas amareladas.

Qual a causa da icterícia?

A icterícia ocorre pelo acúmulo de bilirrubina no sangue. A bilirrubina é produzida pela degradação fisiológica da hemoglobina do sangue, e em algumas situações, a sua excreção está diminuída e ela não é corretamente eliminada do corpo.

A bilirrubina é transportada até o fígado, onde ela se liga a uma enzima para ser excretada. Essa ligação é a conjugação, e a bilirrubina a partir desse momento é chamada de conjugada.

No recém-nascido, pode haver uma imaturidade nesse sistema de conjugação, e o aumento da bilirrubina não conjugada no sangue. Essa costuma ser a principal causa da icterícia neonatal, e nesse caso, a icterícia é fisiológica. A icterícia fisiológica costuma ocorrer a partir das 48 horas de vida, e se resolve em uma ou duas semanas.

A icterícia associada à amamentação ocorre em recém-nascidos recebendo pouco volume de leite, iniciando-se nos primeiros dias de vida e se resolvendo após cerca de uma semana.

A icterícia do leite materno ocorre no final da primeira semana do recém-nascido, e está associada a substâncias presentes no leite materno que interferem no metabolismo da bilirrubina. A icterícia pode durar de 2 semanas a vários meses.

As hemácias podem estar sendo degradadas mais rapidamente que o normal, também causando icterícia. Isso pode ocorrer por doenças hematológicas, como incompatibilidade do sistema ABO ou Rh, deficiência de G6PD, doença falciforme, talassemias, esferocitose.

Uma outra situação em que a icterícia pode ocorrer é no caso de traumas no parto, com hematomas no recém-nascido. Esses hematomas irão sendo absorvidos e a hemoglobina vai sendo degradada.

Quando a bilirrubina já foi metabolizada pelo fígado e ocorre algum problema na sua excreção, a bilirrubina conjugada (bilirrubina direta) estará aumentada no sangue.

Nesse caso, a urina costuma estar escurecida (colúria) e as fezes mais claras (acolia fecal). O aumento de bilirrubina conjugada (direta) no recém-nascido é chamado de colestase neonatal, e requer a pronta avaliação de um hepatologista infantil, indicando lesão no fígado ou nas vias biliares.

A icterícia no recém-nascido é perigosa?

Na maioria das vezes, a icterícia do recém-nascido não oferece riscos, mas em algumas situações, pode ser grave.

Alguns sinais de alerta são:

Icterícia nas primeiras 24 horas de vida
Febre
Letargia, prostração
Icterícia após as duas semanas de vida

Os níveis de bilirrubina presentes no sangue também precisam ser avaliados.

Dependendo dos níveis e da idade do bebê, tratamentos específicos devem ser realizados.

O Kernicterus é uma lesão cerebral causada pelo acúmulo de bilirrubina no cérebro, podendo levar a distúrbios de audição, paralisia cerebral, alterações neurológicas e até mesmo à morte.

O tratamento precoce da icterícia previne essa grave complicação, e o pediatra é o especialista que determinará se a icterícia é fisiológica ou requer tratamento.

Como é feito o diagnóstico da icterícia no recém-nascido?

O diagnóstico da icterícia é feito através da investigação da história clínica e do exame físico realizados pelo pediatra, e de exames laboratoriais (exames de sangue).

Dados importantes do pré-natal serão avaliados, além da avaliação das mamadas, diurese e evacuações do recém-nascido.

No caso de aumento da bilirrubina conjugada, o hepatologista infantil poderá solicitar outros exames, como exames laboratoriais mais específicos, ultrassom de abdome ou biópsia do fígado.

Qual é o tratamento da icterícia no recém-nascido?

A icterícia fisiológica não necessita de tratamento, e se resolve nas primeiras semanas de vida.

A icterícia da amamentação se resolve oferecendo-se mamadas mais frequentes ao recém-nascido, melhorando a ingesta de leite materno do bebê.

A icterícia do leite materno não requer intervenção se os níveis de bilirrubina estiverem dentro dos limites adequados para a faixa etária. Ela se resolverá gradativamente, mas é fundamental o acompanhamento do pediatra para a identificação de outras complicações que podem estar acompanhando o quadro.

A icterícia causada por hiperbilirrubinemia indireta, com níveis de bilirrubina acima do limite adequado para a idade, tem indicação de fototerapia ou exsanguineotransfusão.

A fototerapia é conhecida popularmente como “banho de luz”. A criança é colocada num berço e exposta uma luz específica, que processa a bilirrubina e permite sua excreção pela urina. O tempo de fototerapia é variável, e depende dos níveis de bilirrubina no decorrer dos dias. Assim, exames de sangue são realizados de maneira sequencial para avaliar o tratamento.

A exsanguineotransfusão é indicada para níveis muito altos de bilirrubina, com maior risco de kernicterus.

É um método que remove rapidamente a bilirrubina indireta da circulação do bebê. Através de uma seringa, uma pequena quantidade de cada vez do sangue do recém-nascido é removida e substituída por sangue doado. O procedimento dura cerca de duas horas, e pode ser repetido se necessário.

Nos casos de colestase neonatal, o hepatologista infantil é fundamental para a identificação da causa da hiperbilirrubinemia direta, e para a indicação do tratamento, que pode inclusive ser cirúrgico, no caso de doenças das vias biliares.

Conclusão

A icterícia neonatal é uma condição bastante comum, e pode tanto ter causas fisiólogicas como ser indicadora de doenças graves.

A primeira consulta do recém-nascido com o pediatra deve acontecer até os 7 dias de vida, e a icterícia é um dos principais pontos avaliados.

Qualquer recém-nascido ictérico após as duas semanas deve ser reavaliado pelo pediatra, para a definição da causa e realização do tratamento ou investigação, quando necessário.