A intolerância à lactose é a incapacidade do organismo de digerir um dos principais açúcares do leite, a lactose.
A enzima responsável por essa digestão é a lactase, que transforma lactose em glicose e galactose. A lactase é produzida em abundância no intestino delgado durante o período de amamentação da criança, com diminuição gradual da produção a partir dos dois anos de idade. Por essa razão, cerca de 75% da população adulta mundial é intolerante à lactose. Em indivíduos com ancestralidade negra ou asiática, essa incidência chega a 80-90%, ou seja, é uma condição bastante comum.
A intolerância pode ocorrer de forma total ou parcial, e os sintomas serão mais ou menos intensos de acordo com a forma apresentada.
Qual a causa da intolerância à lactose?
A diminuição da produção de lactase faz com que a lactose permaneça não digerida no intestino. No intestino delgado, isso provoca secreção de água, causando diarreia, e no intestino grosso, consumo da lactose não digerida pelas bactérias, com produção de gases.
A intolerância secundária à lactose ocorre quando alguma condição, como uma diarreia aguda ou outras doenças intestinais, causam lesão no intestino e afetam temporariamente a capacidade de absorção de lactose. Após a condição primária se resolver, a pessoa consegue absorver lactose normalmente.
A hipolactasia congênita, que é a intolerância à lactose desde o nascimento, é uma condição rara e muito grave, causando diarreia intensa e desidratação nos primeiros dias de vida do recém-nascido, pois o leite materno, seu único alimento, tem muita lactose.
Quais os sintomas da intolerância à lactose?
- Diarreia
- Dor abdominal
- Flatulência
- Náuseas
- Distensão abdominal
- Cólicas
- Urgência para defecar após a ingestão de produtos lácteos
É importante ressaltar que esses sintomas também são característicos de outros transtornos gastrointestinais. Uma avaliação pelo gastropediatra é indicada quando há duvida no diagnóstico.
Como o diagnóstico de intolerância à lactose é feito?
O diagnóstico geralmente é clínico, ou seja, não são necessários exames laboratoriais ou exames de imagem para a elucidação da condição. Um teste terapêutico é realizado, e a lactose é retirada, com melhora importante dos sintomas. Algumas pessoas já percebem a relação dos sintomas com a ingesta de leite, e já evitam consumir produtos lácteos.
Existem testes laboratoriais que podem ser realizados. Um deles é o teste de tolerância oral, em que uma quantidade de lactose é oferecida para ingestão, e a medida da glicose do sangue é realizada em intervalos regulares de tempo. Se não houver aumento da glicose após a ingesta de lactose, o indivíduo é considerado intolerante. Algumas pessoas apresentam sintomas durante a execução do teste.
Outro teste é o teste do hidrogênio expirado, em que a pessoa ingere uma quantidade controlada de lactose e o hidrogênio expirado é medido. As bactérias que degradam a lactose não digerida produzem hidrogênio, e um aumento do nível de hidrogênio expirado é sinal de intolerância à lactose.
A intolerância à lactose tem predisposição genética? Existem testes genéticos para a sua detecção?
A intolerância primária à lactose é geneticamente estabelecida, por uma mutação no gene MCM6, que regula a expressão do gene LCT, locus 2q21.
A genotipagem dos genes LCT e MCM6 pode ser realizada. O genótipo C/C produz poucas quantidades de lactase, o genótipo C/T quantidades intermediárias e o genótipo T/T, quantidades normais da enzima.
É importante ressaltar que só a presença da mutação do gene não estabelece o diagnóstico de intolerância à lactose, e os sintomas clínicos têm que estar presentes para a condição ser caracterizada.
Qual o tratamento para a intolerância à lactose?
O tratamento da intolerância à lactose é a restrição de lactose da dieta. A lactose está presente primariamente no leite, sendo encontrada em quantidades menores em queijos, iogurtes e outros derivados. Como cada pessoa, mesmo que intolerante, produz quantidades variáveis da enzima, a quantidade de lactose tolerada na dieta varia.
Há a possibilidade de administração de lactase exógena, quando uma refeição com lactose for realizada, o que permite sua absorção e evita os sintomas da intolerância. A diferença do tratamento da intolerância à lactose e da alergia à proteína do leite de vaca é que no caso do intolerante, não há necessidade de restrição total de leite e derivados, e geralmente a pessoa não tem sintomas com quantidades pequenas de laticínios.
É importante ficar atento à suplementação de cálcio quando uma dieta sem leite e derivados é realizada.
A intolerância à lactose causa alguma complicação?
Algumas crianças com intolerância secundária à lactose podem ter diarreia persistente e perda de peso, e uma avaliação com o pediatra ou gastropediatra nessa situação é muito importante.
A intolerância primária à lactase (do adulto) não costuma causar complicações, sendo uma condição incômoda, porém benigna.
Conclusão
A intolerância à lactose é uma condição comum na pediatria, mas muitas vezes não diagnosticada, sendo confundida com outras doenças e condições gastroenterológicas. Isso gera preocupação nos pais, investigações desnecessárias e intervenções medicamentosas e dietéticas equivocadas.
A consulta com um pediatra ou gastropediatra possibilita o diagnóstico correto, bem como o tratamento e as orientações necessárias para o controle dos sintomas e adequação da dieta da criança.
Dra. Mariana Nogueira de Paula, mãe da Ana Luísa, Helena e do Miguel.
Pediatra, Gastropediatra e Hepatologista Infantil
Santo André e Grande ABC